domingo, 10 de maio de 2015

Sobre amparar pequenos e mamães...

Quando chega o dia das mães  todas aquelas representações femininas tradicionais pipocam por aí. Fica difícil o alerta mental não piscar. Dando o meu pitaco sobre isso confesso que muitas mensagens, propagandas e etc. incomodam pra caramba. Começo pelo fato de que maternidade, mesmo que algumas mulheres possam sentir como instintiva e intuitiva, é também uma construção social em cima do feminino e isso não se pode negar. A ideia de uma mulher fraternal, cuidadosa, preocupada, boa dona de casa, que cozinha bem e mantém os filhos limpinhos estão intimamente ligadas à passividade criada em cima do feminino dando liga à família “margarina”/patriarcal que conhecemos, onde o privado (casa) pertence à mulher e o público (política, cargos de poder, etc.) pertencem ao universo masculino. Claro que muita coisa mudou, mas não para a maioria infelizmente. O tema maternidade tem se feito presente na minha vida já que perto dos 30 anos (meu caso) “naturalmente” amigas começam a parir e familiares começam a questionar o seu desejo de maternidade. Dentro das pautas feministas também é um assunto muito forte. Por esses motivos tenho percebido, mesmo entre mães esclarecidas e informadas, uma reprodução ou reinvenção do velho estigma de “mães perfeitas”.  Não quero entrar muito nessa discussão pois ela pode ser longa e cansativa e como eu não sou mãe posso ser facilmente questionada pelos grupos de mães ativistas (e que bom que elas existem!). Porém, levanto a bola aqui se ao invés de reproduzirmos a super mãe heroína não deveríamos também gastar mais energias para incentivar os super pais heróis dentro do ambiente privado? Ou seja, não só aquele que leva pra jogar bola, fica de legal na foto mas que deveria cuidar diretamente dos valores que são transmitidos aos pequenos. Muitas coisas a se pensar ainda sobre o papel do homem na criação dos pequenos e principalmente sobre suas ausências (mais frequentes do que suas presenças).
Porque penso isso? Por gostar muito de crianças e abrir minha visão com relação ao tema tive uma das melhores iniciativas pessoais nesse ano de 2015 (graças também a um amigo que abriu portas): visitei um orfanato (e tenho visitado sempre que possível).
Isso rasga com tudo que vamos construindo ao longo da vida com relação ao ideal de família feliz. O que é ser pai, o que é ser mãe, o que é ter uma família legal... Os valores da modernidade foram todos calcados no ideal de família burguesa. Crianças em lares institucionais ou de adoção são a antítese disso. Qual então o lugar social delas?
Seria muito radical da minha parte pensar que o mundo deveria ser uma família e cuidar de todos os pequenos? Isso ficou muito forte ao conviver com essas crianças que foram abandonadas pelos seus pais genéticos, ficou muito forte também quando passando pela praça da República em São Paulo vi vários grupos de crianças de rua comportando-se como adultos marginalizados  pedindo dinheiro ou comida. São crianças. São vulneráveis. Estão construindo suas personalidades e referências mas são invisíveis para a maioria das pessoas que nesse mundo vivem.
Meu apelo aqui é que ser mãe ou ser pai não deveria ser uma atribuição única de quem os coloca no mundo pela via biológica, ou mesmo de quem decide adotar uma ou duas crianças, dadas as devidas proporções, claro. O que se evidencia ao conviver com essas crianças marginalizadas pela sociedade é que todos nós somos e seremos referências para elas, principalmente na falta de quem os proveu.  A educação que você dá para o seu filho biológico não pode se estender apenas ao seu ambiente, ou se você não tem e não quer ter filhos, não pode fechar os olhos para o mundo que está construindo para aqueles que virão depois de você. Sempre que na presença de uma criança é importante refletir sobre nossos atos, nossos cuidados, pois eles não devem cair em peso apenas sobre a responsabilidade de uma mulher, aquela que os pariu. É fato: muitas mães já se arrependeram da responsabilidade, muitas mulheres desistiram nas primeiras semanas de gestação, muitas meninas tiveram sua juventude roubada porque a responsabilidade caiu apenas sobre os seus frágeis braços. É importante perceber a tarefa árdua de ser mãe sem o apoio necessário que familiares e a sociedade deveriam dar. Somos todos responsáveis pelas crianças que estão no mundo e se você anda fechando os olhos para os que estão ao seu redor, pedindo inclusive por redução da maioridade penal, sinto muito. Se alguma coisa deu errado no caminho das diversas crianças que nascem todos os dias, somos todos responsáveis. Óbvio que a alienação maternal existe, a omissão e falta de cuidados, etc. Bem sabemos por meio da psicanálise as implicações entre as relações pais e filhos mas a responsabilização prática recai apenas sobre as mãos femininas?
Vou além. Sou professora de adolescentes. Isso se estende até os 18 anos no mínimo. Basta uma busca mental e lembraremos o quanto fomos frágeis na adolescência, o quanto precisamos de afeto, referências, opiniões até pouco tempo atrás... Sinto isso quando meus alunos de 15,16 e 17 anos me pedem referências, abraços, palpites sobre suas vidas pessoais ou então partilham segredos sobre suas vidas.
Tudo isso desemboca numa questão que pertence à todos nós e não apenas aos educadores: a educação. Ouço todo mundo dizer que a educação é a prioridade de todas as pautas para um mundo melhor mas ela ocorre apenas nos bancos das escolas quando crianças são aglomeradas em salas de aula?
Feliz dia das mães, pais, avós, tios, primos, irmãos, amigos que sabem valorizar o esforço de uma mulher no cotidiano dos pequenos e ainda assim olhar para os que estão ao redor refletindo sobre escolhas e atitudes. Um beijo pra mulher forte da minha casa, com açúcar, com afeto (ops! Açúcar não): minha mãe!


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